Culinária ou gastronomia: a arte de encantar. Será?

Opinião - Arthur Coelho

Compartilhe:

Surpresas estão sempre no caminho de uma escolha culinária para uma degustação, seja ela despretensiosa ou totalmente programada para uma noite/dia soberbos.

Os desafios, as técnicas, as tendências, o mercado, os profissionais, são variáveis intimamente ligadas nesse complexo mundo da culinária/gastronomia. A própria designação para o hábito de ALIMENTAR-SE, transforma esse momento que inicialmente é tratado pela Nutrição como “ato de nutrir-se é o fornecimento de macros e micronutrientes, fluidos ou não, para a manutenção do corpo humano saudável” e o mundo da culinária/gastronomia transformou esse ato natural em uma corrida desenfreada na busca do encantamento, na inventividade, no design e na cerimônia cultural cultuada de formas diferentes.

O “encantamento” se tornou uma obsessão, uma caixa de Pandora, uma luta incansável pela descoberta de novas técnicas, ingredientes, louças, soluções de alginato de cálcio, tubos de ensaios, nitrogênio líquido, óculos de proteção, pipetas e pinças cirúrgicas, como instrumentos essenciais para o momento obcecante do “encantamento”, da “surpresa”, do “design” e da fórmula perfeita para saciar a busca incessante da “receita perfeita”, do “prato estrelado Michelin”, dos troféus e das marcações nos livros da ditadura da moda gastronômica.

Será que precisamos dessa “tortura” infindável? Será necessária essa parafernália, que nos deixa louco, buscando o “mercado do sabor milagroso inesquecível”, que fideliza por estrelas, que prospecta a volta do consumidor por causa do cenário “Instagramável”, do momento efêmero  do registro fotográfico para a postagem e da contagem dos “likes”.

As memórias encantadoras e afetuosas, parecem apagadas sistematicamente nesse mundo de circunstâncias instantâneas e furtivas, que são esquecidas já no próximo “flash”. Por que estamos nos perdendo e nos distanciando desse mundo maravilhoso dos sabores familiares, afetuosos, confortantes das nossas melhores memórias gastronômicas, produzidas pelas nossas avós, mães, pais, tias e tios, proporcionados nos almoços e encontros familiares em torno da mesa simples, porém farta, alegre, cheia de vida e de abundância de assuntos, diversidades, risadas e choros das lembranças dos últimos momentos daquele ente que partiu, ou casou, ou pariu, ou cozinhou aquele almoço nababesco!

Ah! Essas memórias não são de saudosismo, mas sim de memórias que não podem se apagar por conta dos modismos, da louça exclusiva ou das estrelas estressantes dos guias midiáticos “digital influencers” ou “Instagramáveis”. Não estou sendo radical ou ortodoxo, mas quero deixar aqui uma reflexão sobre a obrigatoriedade de encantar, surpreender, modificar, reler ou reinventar aquilo que já marcou nossas vidas de forma tão saborosa, tão vívida, tão alegre e esperada como uma ceia de Natal ou abertura dos presentes no momento da festa de aniversário, simples, gostosa, alegre e cheia de vida!